quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

“Almas Gêmeas” (Fernanda Matias)



Mais uma saga invade o mercado editorial direcionado para o público constituído especialmente pelos jovens adultos, Evolução, na qual estão programados quatro volumes de literatura fantástica. Só que desta vez não se trata de anjos ou vampiros, embora os personagens que povoam esta obra sejam também dotados de poderes especiais, ou seja, extra-sensoriais.

Esta é a primeira ficção da brasileira Fernanda Matias, portanto alguns deslizes são desculpáveis, principalmente porque a obra carece de um trabalho editorial mais presente. A autora tem ótimas ideias, as quais algumas vezes surpreendem o leitor. Ela se vale de sua experiência como bióloga para enfocar o tema da evolução humana e de sua relação com as transformações ocorridas no Planeta, principalmente no que se refere à questão da sustentabilidade, na qual ela se especializou.

É interessante a proposta narrativa da escritora, que a cada capítulo apresenta pontos de vista de personagens diferentes; assim, intercalam-se as visões de Penélope, Camila, Fábio e Sílvio. Desta forma é possível desenvolver melhor suas características, saber o que pensam, quais as suas motivações e a forma como enfrentam as transformações a que são submetidos. Falta, talvez, revelar um pouco do que se passa na mente de Bruna, a vilã da história, pois sua mutação ocorre muito repentinamente, quase sem que o leitor a perceba.

Outro elemento importante e favorável é a exploração da cultura tipicamente brasileira, ou seja, de suas raízes indígenas. Ybiracy é a índia que transita entre o sonho e a realidade, de um mundo para outro, através de um enigmático portal. Ela é a personagem que resgata a história das principais tribos do Brasil.

Ybiracy me olhava.
- Não chore, pequena Anrati, tudo vai se resolver.
- Como vai se resolver? Nós nos tornamos monstros! E nem
nos demos conta disso! Que o pior pesadelo de todos não é
aquele que a gente tem enquanto dorme, mas sim nós, os humanos, no nosso
dia a dia.
(...) - Ao seu tempo, pequena Anrati, tudo lhe será revelado.

O enredo é um pouco confuso no início, mas depois vai se tornando mais claro; o único problema é que a autora é um pouco prolixa demais, o que pode cansar o leitor mais habituado a uma trama ágil e repleta de suspense. Fica a sugestão para os próximos volumes, menos divagações por temas paralelos e mais ação; um ou outro comentário extra basta, às vezes na forma de ironia, outras como uma crítica a algo que não extrapole demais a história.

Tudo se passa entre as cidades de Camaquã, onde está localizada a escola na qual os protagonistas estudam, e Arambaré, ainda menor que a primeira, na qual Camila reside; ambas estão situadas no Rio Grande do Sul, terra natal da autora. Os jovens estão atravessando a etapa final do colegial, momento de transformações naturais, quando é necessário planejar o futuro, optar por uma carreira profissional e sair do ninho.

Em meio a estes problemas nada fáceis de enfrentar, Camila, Sílvio, Penélope, Raul, Sara e Jorge descobrem, aos poucos, que possuem dons extraordinários, os quais devem permanecer ocultos até que possam compreendê-los e entender que papel, afinal, eles deverão exercer em uma possível fase de transição que será vivenciada pela Humanidade e pelo próprio Planeta.

Muitas vezes me sentia num filme do X-Men. Sempre me escondendo. Mas faltava
um professor Xavier. E como fazia falta... Um adulto auxiliando nas mudanças.
Agora eu entendia melhor a minha mãe e a sua "chatice de adulto". Talvez por
isso eu procurava ouvi-la mais e tratá-la melhor. Ao menos não tinha virado
um adolescente revoltado como ódio dos pais e tal. Já tinha tantos problemas
para resolver e minha mãe não tinha culpa de nada. Era engraçado ver o
quanto eu comecei a valorizá-la depois dessas mudanças.

Camila, uma jovem de 16 anos, é a última a passar por estas modificações; a partir de então tudo fica ainda mais estranho e assustador, principalmente depois que sua antiga colega Bruna começa a manifestar um inusitado comportamento. A protagonista se reaproxima da ex-amiga de infância, Penélope, e ingressa em seu grupo, levando consigo Fábio, o melhor amigo, o único da turma desprovido, pelo menos aparentemente, de qualquer poder psíquico. Resta ao leitor mergulhar na trama – vale a pena percorrer os trechos mais cansativos – e descobrir o que o destino reserva a cada um destes personagens.

Fernanda Matias é doutora em biotecnologia, gaúcha de nascimento, originária de Porto Alegre, onde nasceu no dia 5 de maio de 1979. Ela reside na cidade de São Paulo há oito anos, e aí desembarcou para realizar seu doutorado. A autora promove palestras nos campos de inovação e sustentabilidade e se considera uma verdadeira narradora de estórias, com incrível dom para misturar ficção e realidade.

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