terça-feira, 23 de outubro de 2012

"Fábrica de Diplomas" (Felipe Pena)


Deseja mergulhar em uma trama policial arrepiante? Recomendo sem hesitar este romance!
Com esta obra, a princípio intitulada O Analfabeto que Passou no Vestibular, Felipe dá início à trilogia do campus, composta também por O Marido Perfeito Mora ao Lado e O Verso do Cartão de Embarque. Os três volumes são protagonizados por Antonio Pastoriza e o narrador, na terceira pessoa, tece um complexo retrato psicológico de cada personagem.

É divertido imaginar que Antonio possa ser o alterego do escritor, pois não casualmente os dois são graduados em Psicologia, lecionam na Universidade e exercitam a literatura ou, como frisa o protagonista, uma espécie de ficção jornalística policial. Embora Pastoriza crie somente em sua língua nativa, o espanhol, e se oculte sob pseudônimos inusitados.

Apesar de não ser um detetive profissional e muitas vezes duvidar de seu poder de análise, é sempre indicado para investigar casos complexos que se desenrolam no contexto universitário. Neste caso ele é diretor da Faculdade de Psicologia da Bartolomeu Dias e auditor da Universidade.

Quando Adriana, uma estudante de Farmácia da Unidade Tijuca, vizinha do Morro do Borel, é atingida em pleno campus, após uma fuga alucinada pelas ruelas estreitas da favela, o reitor e proprietário da Universidade, Jaime Ortega, pede a Pastoriza que desvende o significado de uma letra de funk encontrada junto à aluna e descubra qual a conexão deste papel com o crime.

Aos poucos uma rede intrincada se revela. Qual a ligação entre Lucas, o analfabeto que passou no vestibular da Universidade, e altas figuras da sociedade carioca? Porque ele atirou em Adriana? O iletrado é realmente um ignorante que mal sabe se expressar? Como Nicole, ex-namorada do analista, obtém seus furos de reportagem?

Quem é o Doutor? Qual o papel de Vasconcelos, chefe da Polícia Civil, nesta trama ardilosa? Há algum vínculo entre a venda de cotas da Universidade para os americanos e o crime no campus? Até onde iria o senador Raul Silvério, proprietário do Centro Universitário Provinciano, para destruir Ortega, seu principal adversário?

Pena mergulha no cerne do conflito entre as milícias e o crime organizado. Duas estruturas marginais que se revezam nos morros cariocas e dominam seus moradores. É entre esses poderes paralelos que Adriana acidentalmente se interpõe. Na letra do funk ela inscreve uma mensagem misteriosa, em torno da qual a trama se desenvolve.

À medida que Pastoriza, com a parceria e cumplicidade do detetive Rover, segurança da Faculdade, avança em suas investigações, expõe inevitavelmente as entranhas da Universidade, indicando os rumos preocupantes do ensino em nosso país. Sua ligação com os meandros da política, da imprensa e do crime organizado alimenta uma estrutura viciada que compromete os rumos da educação no Brasil.

Felipe Pena é certamente um bom contador de histórias. Às vezes divaga ao discorrer sobre a decadência da educação universitária, principal foco de sua obra. Nestas ocasiões o autor quebra um pouco o ritmo da trama eletrizante, mas seu poder de unir perfeitamente todos os fios da trama transforma essas digressões em mais um artifício narrativo.

O autor intensifica o suspense ao concluir cada capítulo com uma ponta de mistério. Ele constrói e desconstrói seu romance policial com desenvoltura e boas doses de ironia. Ao mesmo tempo que cria uma história saborosa neste gênero tão desprezado no Brasil, ele se sente à vontade para refletir sobre o mesmo e até para tecer algumas críticas saudáveis, especialmente através de Pastoriza.

Transparece no texto a paixão do escritor pelos romances policiais; aqui e ali tece inúmeras referências literárias, particularmente aos autores deste gênero, como Rubem Fonseca e Dostoiévski, que explora esta vertente em alguns de seus clássicos. Mas também cita Freud e Ferenczi em suas viagens psicanalíticas. Mesmo assim Pena não se enquadra na categoria dos escritores que esbanjam erudição e escrevem para raros; faz questão de privilegiar o leitor, não os críticos. 

Muitas surpresas e reviravoltas aguardam o leitor nesta jornada. A revelação da identidade do vilão é surpreendente. Aliás, esta é uma das passagens mais brilhantes do livro. Nela o autor aproveita para meditar sobre a própria estrutura narrativa do gênero policial através de seu protagonista, quando assume a posição do leitor e tenta através de seu olhar descobrir quem é o Doutor. Genial!
 Felipe Pena é jornalista, psicólogo, doutor em Literatura pela PUC-Rio, pós-doutorado em Semiologia pela Universidade de Paris/Sorbonne III, leciona na Universidade Federal Fluminense, mas se considera um ignorante por decisão própria. Também escreve roteiros para TV e crônicas para o Jornal do Brasil. O autor reside no Rio de Janeiro.

Editora: Record

Autor: Felipe Pena

336 Páginas

Ano: 2011

Volume: 1

Preço: R$ 34,90

Capa: Brochura

Formato: Médio

Edição: 1

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